Sunday, January 10, 2010

Breve biografia de Mariategui

José Carlos Mariategui nasce a 14 de Junho de 1894 em Moquegua, cidade costeira situada no sul do Peru. Filho de Francisco Javier Mariategui, funcionário público em Lima, capital do Peru, e de Maria Amalia La Chira Ballejos, uma mestiça das terras altas do Peru, filha de pequenos agricultores.
A infância de Mariategui não terá sido fácil, tendo em conta que o pai abandonou a família quando era ainda uma criança, o que levou a mãe de Mariategui a ter de deslocar-se, juntamente com a família, primeiro para Lima, e depois para Huacho, cidade situada a norte da capital peruana, onde passou por algumas dificuldades para poder criar os filhos (Mariategui tinha mais dois irmãos, Julio Cesar e Guillermina). O pai de Mariategui viria a morrer em 1907, quando este contava com 13 anos de idade. No entanto, e apesar das dificuldades, a mãe de Mariategui conseguiu encaminhá-lo para a escola de Huacho, onde terá sofrido um acidente em 1902, quanto tinha 8 anos, que lhe deixou a perna esquerda praticamente inutilizada e que lhe viria a provocar grandes transtornos ao longo da vida e estar inclusive na origem da sua morte prematura. Em 1909, aos 15 anos de idade, começou a trabalhar como linotipista (compositor mecânico de artes gráficas) na redacção do jornal La Prensa, para passados três anos apenas, já ser o autor das colunas mais mundanas do jornal. Por volta de 1914, quando contava com 20 anos de idade, e ainda no La Prensa, Mariategui inicia-se no jornalismo de maior rigor intelectual, passando a assinar artigos sobre arte, reportando as últimas notícias da Grande guerra que assolava a Europa e assinando também entrevistas a personalidades ilustres do Peru, usando sempre o pseudónimo Jean Croniqueur. Data também deste período a feitura de dois contos, usando desta vez o pseudónimo Jack. Até 1917 este labor jornalístico vai crescendo, tanto em quantidade como em profundidade, passa a escrever também para a revista El Turf e começam a surgir as primeiras preocupações sociais. Neste período Mariategui era possuidor de um forte sentimento religioso, uma herança materna e que mais tarde se virá a reflectir na sua leitura particular do marxismo. Ainda por volta de 1917 abandona o jornal onde iniciou a sua actividade profissional e é contratado pelo diário El Tiempo, onde é destacado para cobrir a actividade parlamentar peruana.
Importa aqui fazer um breve contexto da realidade política peruana das primeiras décadas do século XX. A nível político o Peru vivia a consolidação do regime republicano, com a promoção de políticas positivistas que visavam o desenvolvimento do país, não deixando contudo de manifestar uma enorme dependência em relação aos países mais industrializados.
No final da década de 10 Mariategui entra na vida boémia de Lima e começa-se a relacionar com aqueles que viriam a ser os seus grandes amigos e companheiros durante largos anos. Falamos de César Falcón, Abraham Valdelomar, César Vallejo e Félix del Valle, todos eles ligados à vanguarda artística e literária peruana. Juntamente com Abraham Valdelomar, e após uma atribulada experiência num cemitério devido a uma tentativa de exibição artística de uma bailarina naquele espaço e que acabou com a prisão de Mariategui e restantes organizadores daquela “performance”, funda a revista cultural Nuestra Epoca, tentando assim furar o conservadorismo dos sectores culturais peruanos. Data também desta época os primeiros contactos com ideias vindas de fora, sendo de destacar Miguel de Unamuno, Araquistain e Alomar. Logo no primeiro número da revista Mariategui assina um artigo claramente ideológico (deixando definitivamente para trás o uso de pseudónimos) intitulado “El deber del Ejército y el deber del Estado”, onde critica os elevados investimentos financeiros no aparelho militar ao mesmo tempo que largas franjas da população peruana enfrentava grandes carências. Este artigo é um marca uma viragem na sua carreira literária, passando a partir daqui a dedicar-se sobretudo à obra política. Em consequência deste artigo, recebe ameaças por parte dos militares, demite-se do jornal El Tiempo por considerar que não teve, por parte do director do jornal Pedro Ruiz Bravo, o apoio que Mariategui desejava para enfrentar esta situação e funda, juntamente com César Falcón o diário La Razón, isto tudo por volta de 1918. Neste jornal o compromisso ideológico com o socialismo é assumido claramente, e quando Augusto Leguía assume o poder no Peru em 1919 o La Razón é já um dos jornais mais importantes e também mais críticos do governo liderado por Leguía. Esta animosidade em relação ao governo levou a que Mariategui tivesse de abandonar o país, rumo à Europa, juntamente com Falcón. Julga-se que esta saída do país tenha sido negociada com o governo de Leguía, que terá colocado os fundados do La Razón perante duas escolhas: ou a prisão, ou a saída para o estrangeiro. Esta viagem em direcção ao “velho continente” vai ser fundamental para a consolidação do pensamento político de Mariategui. Na Europa passa por vários países, tais como França, Itália (onde se casa com uma cidadã italiana, Ana Chiappe), Áustria e Alemanha. Durante a sua estada em Itália assiste, em Janeiro de 1921, ao histórico congresso de Livorno do Partido Socialista Italiano onde se dá uma cisão que acaba por dar origem ao nascimento do Partido Comunista Italiano. Regressa ao Peru em 1923, começa a dar aulas na Universidade do Povo, escreve vários artigos sobre a situação europeia e começa a elaborar as primeiras teses marxistas sobre a situação social peruana. Passa a contactar com Víctor Raúl Haya de la Torre, líder da Aliança Popular Revolucionária Americana (APRA) e responsável pela edição da revista Claridad. Quando Haya de la Torre é deportado pelo governo de Augusto Leguía, em Outubro de 1923, a direcção da revista é assumida por Mariategui. Em Março de 1924 a revista é totalmente dedicada a Lenine, que tinha falecido dois meses antes. Ainda neste ano Mariategui está às portas da morte devido a problemas relacionados com a sua perna esquerda que tem, inclusive, de ser amputada. Em 1926 funda o jornal Amauta com o intuito de estabelecer um fórum de discussão sobre o socialismo, a arte e a cultura no Peru e em toda a América Latina. Em 1927 é detido e encarcerado no Hospital Militar, sendo depois sujeito a prisão domiciliária. No ano seguinte Mariategui começa a distanciar-se da APRA e funda o Partido Socialista do Peru (em 1930 altera a sua designação para Partido Comunista Peruano) estabelecendo-se como secretário-geral do partido. Ainda em 1928 publica a sua obra mais conhecida, intitulada Siete ensayos de interpretacion de la realidad peruana, onde faz uma análise da situação económica e social do Peru. Esta obra é considerada uma das primeiras análises materialistas de um país latino-americano e dá especial atenção ao problema dos indígenas peruanos, defendendo uma transição para o socialismo no Peru baseada nas tradicionais práticas colectivistas praticadas pelos indígenas. Em 1929 funda a Confederação Geral dos Trabalhadores Peruanos e morre no ano seguinte, a 16 de Abril, devido a complicações relacionadas com o antigo problema que lhe tinha afectado a perna esquerda.

Sunday, January 3, 2010

Breve história da UPA/FNLA

A UPA (União das Populações de Angola) foi fundada em Dezembro de 1958 na cidade de Accra, no Gana, e teve como principais dirigentes, na sua fase inicial, os seguintes nomes: Holden Roberto, Manuel Barros Nekaka, François Dombe, António Malembe, Francisco Lulendo, Martim Sumbu, Rosário da Conceição, Alexandre Tati e João Eduardo Pinock. Pouco tempo depois da sua fundação a UPA transfere-se para Léopoldville, capital do Zaire.
Os primeiros actos políticos da UPA deram-se precisamente em Dezembro de 1958 quando Holden Roberto participou nas Conferências Pan-Africanas e Afro-Asiáticas e na Conferência dos Neutralistas em Belgrado. Em território angolano a acção política da UPA iniciou-se em Outubro de 1959 com uma série de distribuições de panfletos nas regiões de Nóqui, Bembe, São Salvador e Buela. A UPA estendia a sua influência, sobretudo, no norte de Angola junto da etnia backongo, de onde era originário o seu líder Holden Roberto. A nível ideológico a UPA caracterizava-se por um forte sentimento regionalista e por uma certa aversão ao comunismo. Em termos de relações internacionais estas davam-se principalmente com o Zaire e com os Estados Unidos da América (EUA).
A 15 de Março iniciam-se os massacres no norte de Angola, tendo sido de imediato reivindicados pela UPA, o que viria a marcar, de forma negativa, o movimento ao longo dos anos. Após ter recusado uma frente única de combate em conjunto com o MPLA, por Holden Roberto temer uma possível subalternização em relação ao MPLA, a UPA funde-se em Março de 1962 com o Partido Democrático de Angola dando origem à Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA). Ainda durante este ano a FNLA proclama o Governo da República de Angola no Exílio (GRAE). O GRAE era liderado por Holden Roberto, que ocupava o cargo de Primeiro-Ministro, no entanto também lá encontrávamos Jonas Savimbi, ao tempo membro da FNLA, cabendo-lhe o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros. Em 1963 o GRAE é reconhecido pela Organização de Unidade Africana (OUA). A FNLA gozou de algum prestígio a nível internacional até 1964 devido à luta armada que desenvolvia de forma relativamente constante no interior de Angola. No entanto, e devido à dependência que o movimento tinha em relação aos EUA, esse prestígio vai-se esbatendo o que provocou a retirada de confiança por parte dos dirigentes africanos e o reconhecimento do MPLA em 1968, por parte da OUA, como o único movimento de libertação legítimo do povo de Angola. Em 1972 as divergências com o MPLA são postas de parte e é constituído pelos dois movimentos o Conselho Supremo de Libertação de Angola, cuja presidência e direcção política era exercida por Holden Roberto, cabendo a Agostinho Neto a vice-presidência e a direcção militar. Mas as diferenças eram muitas e este entendimento nunca chega a efectivar-se. Após o 25 de Abril de 1974 Holden Roberto inicia negociações com as autoridades portuguesas e a 12 de Outubro assina em Kinshasa um acordo de cessar-fogo. Em Janeiro de 1975 a FNLA torna-se signatária dos Acordos de Alvor onde se determina o dia 11 de Novembro do mesmo ano como a data da independência de Angola. No entanto, a partir de Março a FNLA tenta quebrar a posição do MPLA em Luanda e inicia-se um período de conflito militar que perdura, entre estes dois movimentos, até 1976. Durante este período a FNLA passa a ser vista como o principal bastião contra a influência comunista que se registava na nova Angola independente o que implica algum apoio internacional, sobretudo dos EUA, do Zaire e da África do Sul, ao mesmo tempo que contava com o contributo de antigos elementos do exército português e de mercenários estrangeiros. Contudo as forças militares da FNLA falham a entrada em Luanda antes da declaração de independência e as derrotas militares sucedem-se, recuando perante o exército do MPLA e seus aliados cubanos. Em 1980 Holden Roberto assina um acordo entre Mobuto Sese Seko e Agostinho Neto e aceita abdicar da luta armada e a exilar-se em França. Em Agosto de 1992, quando se realizaram as primeiras eleições em Angola, Holden Roberto regressou ao seu país e encabeçou a candidatura da FNLA, quedando-se por um modesto resultado.