Monday, May 28, 2007

Reportagem sobre o MAN

Esta reportagem sobre o Movimento de Acção Nacional, da autoria do jornalista Paulo Costa, foi publicada no jornal Tal & Qual, edição de 6 de Janeiro de 1989.

ELES NÃO BRINCAM AOS FASCISTAS

Chamam-lhes fascistas, ou até mesmo nazis, só porque se saúdam entre si de braço ao alto, se proclamam antidemocráticos e se assumem como racistas; mas eles preferem dizer que hão-de ser uma alternativa face a um «sistema podre», identificam-se mais com o «espírito inicial» do 28 de Maio de 1926 («que derrubou a partidocracia vigente») e dão Primo de Rivera e Rolão Preto como referência.
Eles são jovens, começam a ser muitos, e formam o Movimento de Acção Nacional. O «T&Q» foi ver quem são e como pensam estes jovens nacionalistas portugueses

Eles chamam-se Luís Paulo Henriques, Nuno Oliveira, António Rodrigues, Germano Tralhão. Têm 26, 23, 19, trinta e poucos anos. São todos solteiros, bons rapazes e muito apegados à família, católicos ou sem credo religioso. Quase todos trabalham, e não dão mostras de abastança, mas antes sinais de vidas feitas com sacrifício.
Formam os corpos directivos do Movimento de Acção Nacional. Luís Paulo é o presidente. É em sua casa que a conversa com os jornalistas do «T&Q» tem lugar, num suburbano rés-do-chão no centro da Amadora. De um lado da sala, está uma cristaleira e dois guarda-loiças dos anos cinquenta e algumas cadeiras que já viram melhores dias; do outro lado, debaixo da bandeira negra com a cruz céltica bordada a branco e de alguns cartazes do movimento, frente a uma mesa de sala coberta de um simples pano creme, fala-se de «revolução» e de «conquista do poder».
Na melhor tradição das conferências de imprensa, é Luís Paulo que faz quase toda a conversa. Exprime-se melhor que muitos jovens políticos no poder e vê-se que tem leituras e bagagem cultural. Responde a todas as perguntas, está à vontade entre temas como racismo e violência, e referências a Hitler, a Nietzsche ou a Salazar.
O Movimento de Acção Nacional – explicou-nos ele – foi legalizado como associação por uma escritura pública efectuada na Amadora em Junho de 1985. Surgiram da reunião de vários grupos de jovens e eram menos de quarenta quando começaram. Hoje, são «largas centenas», preferem não especificar.
Estão organizados em termos de células e só não têm núcleos de activistas na Madeira e em três distritos do interior (Bragança, Vila Real e Guarda).
Dentro de dois ou três meses, esperam realizar o seu primeiro congresso. Ainda este ano querem abrir uma sede em Lisboa. Aliás tudo indica que serão dois locais, um reservado, como é evidente, não porque tenham medo, já que «tudo o que fazem é legal» e «quem não deve não teme», mas por em termos de locais públicos lhes ser «mais complicado trabalhar».
O Movimento de Acção Nacional – dizem-nos – é autofinanciado. Todo o dinheiro lhes vem das vendas de material, das quotizações, eventualmente de alguns donativos. Têm o «dinheiro necessário» para fazer o que se propuseram, mas não revelam orçamentos. Ninguém diz, e eles não serão os primeiros.
Têm também «ligações internacionais», formais e directas, com três movimentos congéneres: a Frente Nacional inglesa, o NPD alemão (mais com a juventude nacional democrata) e com o Partido Nacionalista Francês e Europeu, com o qual estão a preparar um folheto para ser lançado em França entre os emigrantes, de um lado é português…
O Movimento de Acção Nacional prepara «uma revolução». Está hoje a formar os homens - «os seus soldados políticos» - para construir «a alternativa nacionalista face ao sistema que hoje existe em Portugal». O seu objectivo final «é a conquista do Poder». Não é tarefa para um ou dois meses: «pode demorar dez anos ou mesmo vinte, o tempo que for preciso».
Eles já estão «a preparar tudo», porque entendem que «o que é preciso é alterar a situação e unir o povo».
Os partidos, consideram, «servem para dividir o povo, para conquistar parcelas de poder». Criticam por isso a «partidocracia» e assumem-se do lado de fora do leque partidário. Querem «organizar-se de uma maneira diferente» e «unir o povo, conquistar o Poder, não tomar uma parcela de Poder momentaneamente».
Não pretendem concorrer a eleições, nem sequer a eleições académicas. «Esta sociedade» - dizem - «está caduca e é preciso mudá-la». Querem por isso construir «uma nova sociedade, com um novo tipo de homem, que tem de ser educado para isso». É o que «estão a fazer agora a si próprios» e o que «vão fazer às outras pessoas».
«E seremos poder, quando o povo manifestar adesão popular às nossas ideias».
A adesão aos seus princípios de grandes alas juvenis já lhes «é evidente». Controlaram já algumas escolas, nomeadamente em Castelo Branco. E controlam hoje algumas associações de estudantes, «através de activistas nossos que são presidente de associações».
Entre as associações estudantis, acham aliás que «estão em todo o lado», mas não enveredam nunca por movimentos «eleitoralistas», nem assumem listas próprias.
«Também não é mentira que estejamos implantados em algumas claques de futebol dos clubes mais representativos. Temos elementos nossos que vão ao futebol e que se incluem nas claques, mas não é nada organizado, porque não tem de ser».
Depois, a pouco e pouco, hão-de pedir outras coisas ao povo. «Hoje, já há dois milhões de portugueses que não votam, mais trezentos ou quatrocentos mil que votam nulo ou em branco…»
A sua revolução, dizem-no e nisso parecem acreditar firmemente, «avançará como o vento».
Contra «um sistema igualitarista», contra «esta sociedade que não interessa, porque é violenta, porque é repressiva, porque nela abunda a droga, a delinquência e nada se faz para combater isso», eles, nacionalistas portugueses apresentam «toda uma outra visão da sociedade».
Não lhes interessa a representação parlamentar, o voto como forma de participação no Governo «como é que se pode dizer que um deputado por Bragança representa trinta mil pessoas se ele está aqui em Lisboa e muitas vezes nem sequer é de lá»
Pretendem, isso sim, «que o povo participe através das associações populares de base, dos sindicatos, das corporações, dos municípios, que esses sabem o que é preciso fazer e até dão bons exemplos, mesmo no sistema em que vivemos».
Em vez do sufrágio universal, «um Estado corporativo». Os partidos que existem – dizem – «têm tendência a ser reformistas». E eles, o que querem é «destruir o que está podre, o que está velho, e construir de novo».
«É preciso revolucionar» - proclamam. Ai está «o radicalismo nas ideias», e «é por isso que às vezes são conotados com a violência, ou a extrema-direita».
Assumem-se como «duros», como «radicais», como «rebeldes». Mas não se entendem nem como violentos, nem como extremistas.
Combatem A, B, C, mas sempre «através das ideias, da escrita e do diálogo», porque a sua «postura» é a de serem «cordiais» e traçarem «o seu próprio caminho».
A violência física «poderá ser uma situação em que sejam colocados», porque «o sistema dificilmente sairá sem reagir» e «nessa altura terão que se defender».
Agora não dizem que «vão planear golpes ou coisas desse género», porque não lhes interessam «acções putchistas do tipo Terrero Molina».
«É mais importante a força das ideias, e o combate positivo, organizado, através de todos os meios legais, do que resignar a acções violentas».
Também por isso, dizem «deplorar» incidentes como os ocorridos recentemente com alguns “cabeças-rapadas” que também integram o seu movimento.
Não são nem querem ser «uma milícia armada». «Ter armas era apenas dar razão àqueles que lhes querem arranjar problemas» declaram, e de momento «só vêem acção dentro das normas legais», mesmo que «não concordem com algumas».
Quanto aos que os apontam como de extrema-direita, dizem que «todas as ideias que têm a ver com as reais necessidades do povo nunca serão de esquerda nem de direita, mas, quando muito, nacionalistas».
Onde eles estão é «do lado de fora, no ponto de intercepção entre a extrema-esquerda e a extrema-direita». Isto nas palavras de José António Primo de Rivera…
É também por isso que não se identificam nem com Salazar nem com Hitler. Podem até admirá-los por algumas das suas políticas, mas tantos anos depois, o que dizem é que «não vale a pena recalcar o passado» e não querem «ressuscitar cadáveres».
«Até porque não queremos andar toda a vida com a cruz às costas, e sermos os fascistas, os maus, apenas porque temos outras ideias…»
Por isso, as suas preferências vão todas para as revoluções populares europeias dos últimos cinquenta anos.
Identificam-se ainda assim talvez mais com «o espírito revolucionário do 28 de Maio de 1926». Porque «foi uma revolução, e não apenas militar. Quem fez aquela revolução foi o povo, que estava farto da partidocracia, que estava farto que se queimassem igrejas, que se mudassem ministros e presidentes a torto e a direito e daquela cambada toda de maçons e judeus».
São assim os jovens nacionalistas portugueses. Saúdam-se de braço erguido, ao alto, à nazi, ou à romana, como eles preferem dizer, mas não o fazem para a fotografia, porque «não gostam de encenações».
O seu futuro próximo será para «consolidar a força do movimento». Para daqui a dez anos, sonham com «uma organização diferente, com outro poderio».
Depois, querem começar a «alterar o curso dos acontecimentos», através da «força das ideias, do movimento popular».
Com uma «elite política», uma «minoria organizada». Porque «a revolução será obra de uma minoria decidida e inacessível ao desencorajamento» …

CIGANOS OLÉ!

«Portugal para os portugueses» é um dos «slogans» do Movimento de Acção Nacional. Para atender a esta reivindicação, os jovens nacionalistas portugueses propõem por isso o repatriamento imediato de cabo-verdianos, indianos, angolanos, moçambicanos, etc., etc.
Não consideram no entanto que o conceito de raça que professam derive de alguma leitura apressada do «Mein Kampf»:
«O que nós dizemos é que cada continente tem determinadas características geográficas e culturais. Normalmente, cada continente tem também um determinado tipo de pessoas, mais escuras ou mais claras».
A Europa – defendem – «é um continente de brancos». E eles consideram-se europeus, «têm orgulho em ser brancos» e «é isso que querem preservar». Portanto, repetindo sempre que «não têm nada contra ninguém», o que dizem é que «as pessoas não se devem misturar. Se há um determinado tipo de pessoas, se há outro, o que não se pode permitir é que haja mesclagens, porque, ao misturar duas raças, elas deixam de existir, puras».
Não que, como brancos, «se achem superiores ou inferiores». Mas julgam-se no direito de «preservar» a sua raça, a sua cultura e as suas tradições. Assumem-se como «diferentes».
Por causa disso, não condenam «as relações de amizade», não condenamos «que brancos e negros vivam em comunidade» (o que aliás consideram «extremamente difícil, porque toda a gente sabe dos conflitos que há em África, entre as próprias tribos de negros, e os conflitos que há nas sociedades multiraciais»).
Daí que entendam que «deve haver um repatriamento massivo para determinados países de origem».
«Portugal não pode continuar a suportar refugiados angolanos, moçambicanos e não sei quê, e pagar-lhes ali as despesinhas todas» - dizem. Citam Rodrigo Emílio, um dos seus teóricos preferidos: «Dantes havia um sonho, que se tornou impossível. Eles quiseram que fosse assim. Então, Portugal neste momento não tem que ter responsabilidades nenhumas».
«Hoje, nós estamos aqui e é esta a nossa terra. A nova geração de portugueses não tem sequer que pagar pelos traidores que fizeram a descolonização».
Consideram também o «problema demográfico», e dizem por isso não poder concordar que «uma família de portugueses tenha um ou dois filhos, como hoje já é normal, e uma família de negros ou de indianos que viva nas barracas tenha sete, oito, nove ou dez, quando não há condições para isso».
«Há que criar certas e determinadas limitações» - concluem. Não que a eles os mova «nada contra as pessoas, contra aquilo que eles são, os cabo-verdianos, por exemplo». Pelo contrário, eles «até os querem preservar». Para isso, até citam uma organização negra americana que diz que «os negros devem voltar para África, e não se devem misturar…»
Talvez por isso, a única «raça estranha» que os nacionalistas portugueses dizem respeitar, senão admirar mesmo, de certa maneira, é a dos ciganos: «Um povo nómada, que mantém a sua cultura e a sua tradição, e que normalmente não se mistura com quem não seja do seu meio».

POLÍTICOS

Os jovens nacionalistas portugueses têm pontos de vista muito próprios acerca das figuras políticas e da própria situação política portuguesa, tanto do passado como do presente.
Em resumo, é isto o que eles, pela voz dos seus dirigentes, pensam de:
CAVACO SILVA - «Tenta ser relativamente populista, quer dar aquela imagem, por isso tem tempos de antena todos os dias nos “Telejornais”, às vezes até em situações caricatas (no outro dia, esteve a dar cinco minutos de notícias no “24 horas”, a falar do Panamá e da América do Sul, sempre com a fotografia dele). Pronto, chegou lá, prometeu muito, não fez nada, é só mais um homem com um elo emprego».
MÁRIO SOARES - «É uma pessoa que pouco ou nada tem a ver com a realidade, ligado à Maçonaria quando 95% dos portugueses são católicos. Antes do 25 de Abril, teve um passado político de combate, mas consta que teve também umas atitudes desonestas em relação a certos símbolos nacionais».
«De resto é uma pessoa que sabe dar os seus belos golpes de rins, aliás provou-o. No actual sistema acaba por ser apenas um boneco, representa, mas não sabe bem o que representa. Além disso, deve ser o português que mais viaja».
«Às vezes, oferece-se aí umas medalhas a título póstumo. Quanto a Mário Soares, um dia, talvez não seja já no seu tempo, se Deus quiser há-de fazer-se o julgamento dele, e de outros homens que fizeram actos como a descolonização, para responder por todos os crimes, pelo milhão de mortos de Timor, pela descolonização exemplar, pelo terrorismo que existe em Portugal».
ÁLVARO CUNHAL - «Está a caminhar para o lado contrário e assim irá continuar toda a vida, há-de morrer agarrado aquilo». Mas «eventualmente saberá o que quer, tem os seus princípios» e, embora «lhes repugne», respeitam-no por isso, «porque de certa maneira tem tido até uma postura mais recta do que outras pessoas».
PSD - «É mais um partido como os outros, um bocado do sistema mesmo, uma máquina que dá de comer a muita gente e paga bons ordenados».
CDS - «É aquela direita conservadora que parou no tempo. Marca passo, e está ali e já não vai para lado nenhum, como está mais que provado».
PS - «É aquele partido que foi feito para ser poder e não o é. Por isso tem montes de pessoas lá dentro que não sabem o que hão-de fazer, e que entretanto ajudam a destruir o seu próprio partido. De resto, é apenas mais um partido de esquerda».
PC - «É um fóssil vivo. Continua a ser o que era há cinquenta anos e está a envelhecer. Tem uma grande máquina, sim senhor, mas é um partido caduco e está a perder toda a influência que tinha».
A DIREITA PORTUGUESA - «Politicamente não existe, porque ou alinha com a esquerda, e tem por exemplo uma política externa de esquerda, ou tem medo. Sobretudo, além de conservadora, é extremamente passiva. Limita-se a não fazer nada, não ser nada e entrar no joguete dos outros. O que é que representa aquilo que seja passivo, quieto, que não faça durante não sei quanto tempo, à parte umas situações corruptas que por ai vão havendo?»
SALAZAR - «É uma pessoa que na história contemporânea portuguesa tem realmente a sua importância. Foi um grande estadista, cometeu erros como toda a gente, mas foi de longe muito mais eficaz durante anos que toda esta cambada».

Friday, May 25, 2007

Juventude Leonina - Esboço duma possível história (cont.)

O início dos anos 90 significam para a Juventude Leonina a transferência da mítica Ponta Sul para a Superior Sul do Estádio de Alvalade, isto já no mandato de Sousa Cintra, eleito em 1989, depois de um período de grande turbulência directiva e desportiva motivada pela direcção do polémico Jorge Gonçalves, que dirigiu o clube durante a época 1988-89. É também neste período que se começam a falar pela primeira vez de infiltrações de extrema-direita nas claques de futebol, e a Juventude Leonina não foi excepção, e começaram-se a ver bandeiras com cruzes celtas junto das faixas da claque. Se estas bandeiras neo-nazis tinham de facto algum significado político ou se não passavam de simples exibicionismo, é uma questão que se pode colocar. De qualquer das formas, e servindo de simples registo histórico, a foto mais antiga onde se pode observar este tipo de simbologia junto da claque refere-se a um Sporting-Benfica da época 1988-89, disputado na penúltima jornada deste campeonato, ganho pelos benfiquistas, e onde o clube da Luz venceu por dois golos sem resposta.

Wednesday, May 23, 2007

Juventude Leonina - Esboço duma possível história

A Juventude Leonina é, actualmente, o mais antigo grupo organizado de adeptos em Portugal. Tendo sido fundada em 1976 pelos filhos do então presidente do Sporting, João Rocha, de inicio não seria mais que um grupo de jovens que entre si partilhavam afinidades clubísticas e de amizade, até porque muitos seriam colegas no colégio São João de Brito em Lisboa. De início, e ao contrário do que se veio a verificar mais tarde, as principais influências vinham das torcidas organizadas do Brasil, de certa forma dando continuidade a uma tradição de apoio organizado que já existia em Alvalade na década de 70, com os célebres Vapores do Rego, um grupo de jovens brasileiros que se destacava pelas suas alegres batucadas e que ajudaram a equipa a vencer o campeonato de 1973-74, equipa onde pontificavam, entre outros, Vítor Damas e Hector Yazalde. Ou seja, as influências inglesas (através da cultura hooligan) e italianas (pelo exemplo dos grupos ultra) vieram mais tarde, mais concretamente no início dos anos 80. Ainda no que diz respeito aos primeiros anos de vida da Juventude Leonina, a sua formação estava integrada num projecto de grande dinamismo que o presidente João Rocha trouxe ao Sporting, que se traduziu na construção de grandes equipas de futebol, que culminaram nas "dobradinhas" de 1973-74 e 1981-82, para além do título de 1979-80, e num ecletismo que implicou as vitórias no hóquei em patins, no andebol, no basquetebol, no atletismo e em muitas outras modalidades, convém não esquecer que em 1986, quando João Rocha abandonou a presidência do Sporting, o clube contava com mais de 100 000 sócios. Nos primeiros anos da década de 80, a claque encontrava-se situada na Superior Sul do Estádio de Alvalade, tendo passado, por volta dos anos de 1983/1984, para a célebre Ponta Sul. Neste período já encontramos a claque com uma maior organização, começam a surgir as primeiras faixas, as primeiras bandeiras com simbologia alusiva à claque e a utilização regular de fumos, seguindo o modelo italiano dos grupos ultra. Toda a cor e alegria que a Juventude Leonina trazia aos estádios portugueses fez com que nos outros clubes começassem também a surgir grupos organizados de apoio, compostos essencialmente por jovens, como foi o caso dos Diabos Vermelhos no Benfica fundados em 1982, dos Dragões Azuis no F. C. Porto, fundados também no início da década de 80, da Fúria Azul no Belenenses e dos Panteras Negras do Boavista, fundados em 1984, da Alma Salgueirista do Salgueiros e da Mancha Negra da Académica de Coimbra, fundadas em 1985, ou seja, na primeira metade da década de 80 quase todos os clubes que disputavam a primeira divisão contavam com uma claque organizada, sendo de referir que só no Sporting chegaram a existir em simultâneo, por volta de 1986,quatro grupos reconhecidos oficialmente pela direcção sportinguista (Onda Verde, Força Verde, Norte Leonino e Juventude Leonina), para além daqueles que não contavam com o apoio oficial (por exemplo, a Torcida Verde fundada em 1984, cujos fundadores chegaram a militar na Juve Leo, e que só viu o seu apoio reconhecido a nível oficial em 1988). Toda esta proliferação de claques organizadas culminaram nos Congressos Nacionais de Claques organizados nos anos de 1984 e 1985.
Os anos 80 significam para o Sporting o início do longo jejum no que diz respeito a títulos no futebol sénior. Com excepção das vitórias alcançadas na gloriosa época de 1981-82, só há a destacar a vitória na Supertaça da época 1986-87, resultante da presença na final da Taça de Portugal perdida para o eterno rival Benfica. Mas foi também na década de 80 que as claques de futebol se instalaram definitivamente no imaginário desportivo português, constituindo o Estádio de Alvalade um exemplo para os restantes clubes no que diz respeito a apoio organizado. Foram várias as claques portuguesas que adoptaram o nome "Juventude", ou até mesmo o diminutivo "Juve" (ex: Juventude Bracarense no Sporting de Braga, ou Juve Negra no Tirsense), influenciadas, muito provavelmente, pela dinâmica e capacidade de organização que a Juve Leo demonstrava, às quais não seria alheias certamente as ligações familiares dos fundadores da claque.Começaram também nos anos 80 as deslocações ao estrangeiro por parte da Juventude Leonina, a primeira terá talvez sido a Sevilha na época 1983-84 em jogo a contar para a Taça UEFA. Seguiram-se outras como Auxerre (1984-85), Roterdão, Bilbao (ambas na época 1985-86), San Sebastian (com a Real Sociedad em 1988-89) e a Nápoles (1989-90), onde na equipa local pontificava um senhor de nome Diego Armando Maradona... Contudo, ficaram também célebres as noites europeias de Alvalade, donde se podem destacar os jogos com Athletic de Bilbao, Barcelona, Atalanta, Ajax e o já referido Nápoles de Maradona.No entanto, o apoio dado pela Juve Leo ao clube não se limitava ao futebol, e desta forma modalidades como o hóquei em patins ou o andebol (sendo de recordar no caso específico do andebol a final da Taça de Portugal da época 1988-89, disputada em Loures contra o eterno rival da 2ª Circular) também beneficiaram da presença da claque no pavilhão ou na nave do antigo Estádio José de Alvalade.

Subsídios para a história da extrema-direita em Portugal no pós-25 de Abril

O Movimento de Acção Nacional

Em Junho de 1985 um grupo de jovens da zona da Amadora regista no cartório a Associação Cultural Acção Nacional, cujos princípios consistiam na “defesa dos valores nacionais, étnicos, culturais, éticos e espirituais”. Este grupo de jovens era constituído por Vítor Santos, Manuel Andrade, Alexandre Freire, Paulo Sequeira e José Luís Paulo Henriques, sendo que a ideia de organizar uma associação deste cariz partiu deste último, que já tinha militado na Juventude Centrista, e que se destacava dos restantes pela sua força de vontade e dinâmica, e desde cedo “Zé Gato” (alcunha pela qual também era conhecido José Luís Paulo Henriques, pelas semelhanças futebolísticas que tinha com o antigo guarda-redes benfiquista) tomou em mãos a direcção do grupo. Posteriormente a associação passou a designar-se Movimento de Acção Nacional (MAN) e começa a dar os primeiros sinais de dinamismo, reflectindo-se na edição do seu primeiro órgão de informação, o jornal Acção, isto já no ano de 1986, sendo mais tarde substituído pelo Ofensiva. Naquele que foi o primeiro jornal do movimento podia-se ler que “o MAN caracteriza-se por uma Terceira Atitude, que se coloca em oposição ao Capitalismo e Socialismo”, sendo o seu lema, impresso nos cartazes que já começavam a povoar as paredes da zona de Lisboa, “Nem Capitalismo! Nem Comunismo! Terceira Via! Por Portugal!”. Esta atitude de inconformismo aliada à divulgação de propaganda provoca a adesão de muitos jovens, entre os quais um grupo de jovens de Almada, que tinham em comum o gosto pela cultura skinhead, e que em 1987 resolvem aderir ao MAN. Ainda neste ano, e aproveitando a dinâmica que a adesão dos primeiros skinheads provocou, é editado o primeiro número do Combate Branco, dirigido aos militantes mais radicais do movimento. A influência do MAN chega ao Norte do país, onde começam a surgir os primeiros militantes, e onde surge a primeira publicação, intitulada Vento do Norte. Esta junção com os famigerados skinheads veio a provocar vários dissabores ao MAN, que aos olhos da sociedade portuguesa foi sendo visto como uma organização de extrema-direita composta em grande parte pelos chamados "cabeças rapadas", que se caracterizavam (pelos exemplos vindos do estrangeiro, nomeadamente de Inglaterra, onde nasceu, nos anos 60, esta subcultura) pela violência e pelo racismo. Em 1989 começam a surgir os primeiros problemas, ao mesmo tempo que começam a surgir as primeiras cruzes celtas (símbolo adoptado pelo MAN) nos estádios de futebol, sinal da influência que os skinheads começavam a ganhar nas claques dos principais clubes portugueses. Em Maio deste ano o actor João Grosso é agredido por um grupo de sete skinheads em Lisboa, tendo perdido um testículo em resultado do espancamento, sendo de referir que João Grosso estava a socorrer um outro jovem que estava a ser agredido pelo mesmo grupo. A comunicação social começa a reportar alguns episódios de turbulência na noite lisboeta, nomeadamente confrontos no Bairro Alto, mas é a 28 de Outubro que se dá o acontecimento que, muito provavelmente, levará à auto-extinção do MAN. Neste dia um militante do Partido Socialista Revolucionário (PSR), José Carvalho, é esfaqueado junto ao coração mesmo à porta da sede deste partido, na Rua da Palma em Lisboa, o que provocou a sua morte. Tudo terá acontecido quando um grupo de skinheads oriundo da Margem Sul forçou a entrada na sede do PSR, onde estava a decorrer um concerto promovido pelo partido inserido numa campanha contra o militarismo. O autor do golpe fatal terá sido Pedro Grilo, condenado a 12 anos de prisão por homicídio voluntário qualificado no julgamento que decorreu no Tribunal de Monsanto a 21 de Março de 1991, presidido pelo juiz Ricardo Cardoso, e onde foram também condenados Américo Silva (pena de 7 anos), Melchior Santos (6 anos) e Gabriel Ferreira (5 anos), os três condenados pelo crime de ofensas corporais e co-autoria da morte do militante do PSR. Filipe e Miguel Temporão foram condenados a 18 e 15 meses de prisão, respectivamente, mas com pena suspensa, Francisco Mascarenhas e Carlos Mariani foram absolvidos. Pedro Grilo sempre reclamou inocência, e a faca que provocou a morte de José Carvalho nunca foi encontrada. Cinco meses depois de ter sido condenado Pedro Grilo evade-se da cadeia do Linhó, dentro do carro da roupa suja juntamente com outros dois reclusos, sendo desconhecido até hoje o seu paradeiro. Mas os incidentes não se limitavam à cidade de Lisboa, também no Porto os skinheads faziam estragos. A 19 de Novembro de 1989 o angolano Francisco Faustino é espancado na zona da Boavista, sendo posteriormente abandonado, inconsciente, na linha férrea. Também neste dia dois cidadãos espanhóis são agredidos pelo mesmo grupo no centro comercial Brasília. O caso relativo a Francisco Faustino é levado também a julgamento, são constituídos 12 arguidos, sendo a decisão proferida a 14 de Abril de 1997, não chegando a condenar à prisão nenhum dos envolvidos, ora por falta de provas, ora devido a amnistias. Já a terminar o ano de 1989, talvez o mais atribulado da história do MAN, um jantar organizado no Porto a 1 de Dezembro, que visava uma maior aproximação entre a estrutura dirigente do movimento, situada em Lisboa, e os militantes nortenhos, acaba em confrontos entre os dois grupos, o que denotava a fragilidade da base de apoio do MAN. Sensivelmente no mesmo período José Luís Paulo Henriques tenta uma demarcação dos skinheads, e apela a uma maior discrição por parte dos militantes mais radicais, o que não é bem recebido por alguns dos membros do MAN, que abandonam o movimento para formar a Frente de Defesa Nacional (FDN), no entanto esta última não consegue ter o impacto que o MAN teve na sociedade portuguesa no final dos anos 80. A actividade do movimento reduz-se drasticamente, e só volta às páginas dos jornais em 1993 quando o Ministério Público solicita ao Tribunal Constitucional a extinção do MAN por ser uma organização que perfilha a ideologia fascista, proibida pela Constituição Portuguesa, aliada aos acontecimentos violentos que alguns dos seus militantes protagonizaram em Lisboa e no Porto. A 20 de Setembro deste ano começa o julgamento, onde os antigos dirigentes do MAN assumem a admiração pelo Estado Novo de Salazar, mas recusam a conotação com o Fascismo e com a violência dos skinheads, não desmentindo, porém, a infiltração destes no movimento. No início de 1994 o Tribunal Constitucional indefere o pedido de extinção do MAN pelo Ministério Público por ter chegado à conclusão que este já se encontrava extinto.


A extrema-direita e as claques de futebol

Mas se os anos 90 viram o desaparecimento do MAN, também viram o surgimento da extrema-direita em grande destaque noutros palcos, desta vez menos políticos e mais desportivos. Em 1991, Gaspar Fernandes, responsável operacional da PSP pelo policiamento dos estádios da Grande Lisboa, confirma em entrevista ao Diário de Notícias a presença de elementos da extrema-direita nas claques dos grandes clubes portugueses. Mário Machado, skinhead que vem a ter um enorme protagonismo anos mais tarde, terá tomado contacto com esta ideologia sensivelmente nesta altura, e terá sido nas bancadas do antigo estádio José Alvalade, e no seio da claque sportinguista Juventude Leonina, que pela primeira vez privou com skinheads, conforme o próprio assume em entrevista concedida ao jornal Correio da Manhã em Maio de 2005. Os primeiros anos da década de 90 ficam marcados pelos primeiros episódios de violência protagonizados pelas claques. Em Março de 1992, após o jogo entre Sporting e o F. C. do Porto a contar para a Taça de Portugal, os adeptos sportinguistas envolvem-se em confrontos com a polícia dentro e fora do estádio. Durante esta época de 1991-92, a exibição de bandeiras neo-nazis no seio das claques do Benfica, Sporting e F. C. do Porto são uma constante, mas é na época seguinte, 1992-93, que a situação se agrava, tendo a comunicação social dado grande atenção ao facto. Ainda em 1992, também em jogos a contar para a Taça de Portugal são exibidos símbolos de extrema-direita. Em Loulé, durante o Louletano – Benfica, membros dos Diabos Vermelhos exibem uma bandeira com a cruz suástica, e no Barreiro, no jogo Barreirense – Sporting, uma enorme faixa, contendo a palavra Skinheads e ladeada por uma cruz celta, é colocada na rede do estádio, precisamente na zona onde se encontravam as claques do Sporting. Mas não era só em estádios de clubes pequenos, onde o policiamento é mais fraco, que estes símbolos eram exibidos. Em pleno estádio da Luz, em Lisboa, no jogo que opôs o Benfica ao Dínamo de Moscovo, a contar para a Taça UEFA, a claque No Name Boys exibe uma faixa relativa às Waffen SS, a força de elite do exército nazi. A confirmação da infiltração da extrema-direita nas claques de futebol surge nas páginas da revista Sábado, onde é feita uma reportagem sobre o assunto, e onde membros da Juventude Leonina, incluindo o seu líder Fernando Mendes, posam para a foto fazendo a saudação nazi e segurando uma bandeira com a cruz celta. Mais tarde, em entrevista concedida ao jornal A Bola, o mesmo assume que o fez por uma questão de protagonismo, com o intuito de que a comunicação social desse alguma imagem da claque, e desvaloriza a saudação nazi, afirmando que fez o mesmo aquando do seu juramento de bandeira durante o serviço militar. Mas é no início do ano de 1993 que a opinião pública desperta em definitivo para esta situação. A 3 de Janeiro, durante o intervalo do jogo Belenenses – Benfica, membros afectos à claque No Name Boys provocam incidentes e agridem um funcionário do clube do Restelo, por este ter tentado impedir que os jovens benfiquistas vandalizassem o marcador do estádio, no seguimento dos incidentes é exibida uma bandeira com uma cruz suástica por um suposto membro dos já referidos Diabos Vermelhos, tudo isto captado pelas câmaras da televisão e visto por milhões de portugueses. Dias depois começam as reacções, a direcção do Benfica decide retirar o apoio às suas claques e o presidente do F. C. do Porto, Pinto da Costa, pede a demissão de Dias Loureiro, responsável pela pasta da Administração Interna do governo de Cavaco Silva, responsabilizando-o pelos últimos acontecimentos. A conexão entre este despertar da violência nos estádios de futebol portugueses e as infiltrações da extrema-direita começou a ser feita pela opinião pública, o que ainda perdura, sendo algo sempre reforçado por associações como o SOS Racismo.